Rapidamente
a policia francesa identificou, perseguiu e assassinou os irmãos Said e Chérif
Kouachi, tidos como autores do atentado contra a revista Charlie Hebdo. Teria
encontrado estranhamente uma carteira de identidade deles num veículo. Os irmãos eram velhos conhecidos dos serviços
secretos franceses, que provavelmente os tenha recrutado para servir à guerra
colonialista da França na Líbia e Síria. A mulher de um deles conseguiu furar o
bloqueio da segurança e logo apareceu na fronteira da Turquia com a Síria. Um
dos implicados no massacre já teria sido recebido em audiência por Sarkozy.
Esses e outros fatos são muito estranhos.
Publicações
e personagens vinculadas ao próprio imperialismo (Paul Craig Roberts,
ex-secretário do tesouro americano, Julian Assange e outros) afirmam tratar-se
de um atentado de “bandeira falsa”, uma provocação do próprio imperialismo. Atentados
de “bandeira falsa” têm sido uma constante nos últimos anos para acusar os seus
inimigos: o abate do avião de passageiros pelo governo ucraniano, para implicar
a Rússia; o massacre por armas químicas na Síria pelos “rebeldes” pró-Estados
Unidos, para acusar Assad. Historicamente sabemos que quase todas as guerras
são provocadas por atentados de “bandeira falsa”.
A versão apresentada pelo governo
francês não merece credibilidade. No momento em que foram assassinados, os
irmãos Kouachi estavam cercados e não possuíam reféns. Porque não foram
capturados vivos? A forma da sua morte caracteriza uma típica queima de
arquivo. O que poderiam contar? Que provavelmente agiram a mando do Mossad e da
Cia? Ou poderiam negar o assassinato? Nesse caso, ficaria evidente a participação
dos serviços secretos. Essa hipótese seria reforçada pelo depoimento do
policial muçulmano assassinado antes de morrer ao seu irmão de que não se
tratavam de muçulmanos.
A AL-Qaeda do Iêmen assumiu a autoria do
atentado, coisa que não contraria as hipóteses anteriores. As autoridades e a imprensa
afirmam que o atentado foi obra de “terroristas islâmicos” para vingar a honra
do islã e de Maomé, ultrajadas pelas charges da revista. Nem a autoria da AL-Qaeda
nem a hipótese de ato isolado de muçulmanos
anulariam a responsabilidade do imperialismo, como legítimo pai de toda
a barbárie terrorista, e que continua a seu serviço. E porque direta ou
indiretamente teriam deixado o massacre acontecer já que conheciam todos os
passos dos irmãos Kouachi.
Os cartunistas pagaram o preço da
provocação imperialista contra os muçulmanos. As evidências do massacre trazem
o DNA dos serviços secretos ocidentais. Existe quem alegue que o atentado teve
o objetivo de enquadrar ainda mais a França às ordens dos Estados Unidos, já
que havia declarado apoio ao Estado Palestino e reclamava das sanções à Rússia.
O significado do
massacre
O
atentado à Charlie Hebdo somente beneficia o imperialismo, e particularmente o
fascismo europeu, favorece a sua ofensiva contra os povos, tendo como “bode
expiatório” o terrorismo “islâmico”. O colapso da União Soviética eliminou o
espantalho do comunismo a justificar a sua política belicista de interesse da
indústria armamentista, pilar da economia capitalista. Foi necessário criar um
novo inimigo imaginário, aquilo que foi batizado como o inimigo “islâmico”.
Para justificá-lo criou-se a teoria do choque de civilizações: de um lado a
civilização ocidental, cristã e democrática e, de outro, a civilização
islâmica, fundamentalista e bárbara. Isso é uma farsa em todos os sentidos. Não
por acaso, a civilização muçulmana está assentada sobre as maiores jazidas de
petróleo e gás do planeta.
Originalmente, a civilização islâmica
foi muito mais tolerante que a civilização cristã. Foram os primeiros a abolir
a escravatura, mil anos antes que o ocidente. Viveram em harmonia com as outras
religiões (cristãos e judeus) na península ibérica, que dominaram por
oitocentos anos, e no próprio oriente médio. Até recentemente dominava no mundo
árabe o pan-arabismo laico de Nasser. A OLP é laica, assim como o foram as
ditaduras do Sha do Irã, de Sadan Hussein no Iraque, de Kadafi na Líbia e como
o é a de Baschar al Assad, na Síria. O fundamentalismo islâmico se restringia à
Arábia Saudita, que patrocinava a seita salafista wahabi. O crescimento do
fundamentalismo é fenômeno recente, junto com seu apêndice terrorista: AL-Qaeda,
Estado Islâmico, al Nusra, etc.
Na metade do século XX, os Estados
Unidos haviam favorecido a criação da fundamentalista Irmandade Muçulmana, no
Egito (que se espalhou para outros países), para combater o nacionalismo
nasserista. Na década de 70, criou e armou o Taliban e a AL-Qaeda, para se opor
à União Soviética no Afeganistão. A partir daí, os petrodólares da Arábia
Saudita, aliada dos Estados Unidos, são postos a serviço da expansão desse
fundamentalismo e da criação de verdadeiros exércitos mercenários para
intervenção em qualquer país que contrarie os interesses do império. Assim foi
feito na Chechênia, Iraque, Líbia, Síria, Nigéria (Boko Haran), Ucrânia. Todos
os países invadidos por razões “humanitárias” viraram terra arrasada, campos de
concentração e cemitério de milhões de pessoas (Afeganistão, Líbia, Iraque),
entregues à sanha desses grupos terroristas, que dizem combater.
Após 11 de setembro/2001, os Estados
Unidos e seus aliados vassalos anunciaram a guerra ao “terrorismo mundial”.
Invadiram o Afeganistão, Iraque, Líbia e acossam a Síria. Apesar de terem
deposto o Taliban, matado Bin Laden e recentemente alegarem combater o Estado
Islâmico, o terrorismo e o imperialismo não estão em lados opostos. O ocidente
imperial necessita do terrorismo tanto como amigo quanto como inimigo. Como
amigo, o usa contra a Rússia, Líbia, Iraque e Síria. Como inimigo, serve para
justificar guerras de interesse da indústria da morte. É um jogo duplo, cínico
e macabro. Os Estados Unidos lideram uma ampla coalizão contra o Estado
Islâmico e este, milagrosamente, continua a avançar. Existem diversas denúncias
de que os Estados Unidos continuam ajudando o EI, a mais recente feita pelo
parlamento iraquiano. Além da Arábia Saudita e Catar, tradicionais
financiadores do terrorismo, Turquia e Israel também lhe dão cobertura.
Os atentados terroristas promovidos por
esses grupos mercenários, não se explicam apenas pelo ódio de indivíduos
tresloucados, indignados pela barbárie cometida contra os povos muçulmanos,
como a imprensa divulga. Esses grupos são dirigidos por mercenários a serviço
do imperialismo e os seus atentados terroristas são decididos nos altos
escalões dos serviços secretos ocidentais (CIA, M16, Mossad, etc.). Têm um
objetivo friamente calculado: justificar guerras, alimentar o ódio aos
imigrantes, favorecer a direita fascista européia e alimentar a suposta “guerra
de civilizações”, insinuando que a barbárie é uma característica de todo o
islã. O inverso não é verdadeiro. Jamais se atribui ao cristianismo o
terrorismo fascista europeu, tal como o assassinato de 77 pessoas pelo
norueguês Breivik.
Não é mero acaso os atentados serem
revestidos de requintes cruéis, como as decapitações promovidas pelo Estado
islâmico. Pretendem propositalmente propagar o medo e a revolta contra a
civilização islâmica em geral. Não é o islã o responsável por essa barbárie,
mas os seus inimigos internos travestidos de seguidores de Maomé, que em
público ajoelham-se em direção a Meca e em privado acendem velas para o diabo.
Quem é Charlie
Hebdo?
As
charges da Charlie Hebdo nada tem a ver com o massacre, a não ser como
pretexto. Mas existem os que consideram as ofensas ao islã a razão do atentado,
mesmo que injustificada. Abre-se uma discussão sobre a liberdade de imprensa,
os limites da sátira e o respeito às religiões. Somos de opinião de que não
existe liberdade de expressão no abstrato. No capitalismo, os meios de
comunicação estão na mão de monopólios privados, agentes da mentira e da
lavagem cerebral dos povos. Liberdade de imprensa é sinônimo de manipulação do
povo. Lutamos pela ampliação das liberdades para os trabalhadores, porque, em
geral, a burguesia já tem a sua liberdade garantida. A liberdade de expressão
faz parte da luta de classes e com esse critério devemos julgar as suas charges.
Existem aqueles que consideram a Charlie
Hebdo uma revista de esquerda, irreverente, contestadora das religiões em
geral, inimiga do capitalismo e do fascismo. Para nós, ao contrário, está a
serviço do colonialismo francês. Reconhecemos as suas opiniões laicas, antifascistas
e anticapitalistas, mas o seu verdadeiro papel é determinado pelo conjunto da
sua obra. Não defendemos a censura prévia, mas temos o direito de criticar
aqueles que sustentam o imperialismo por traz de uma fachada liberal e
anti-religiosa. É consenso que a ênfase maior da revista é a ridicularização do
islamismo e de seu profeta Maomé. Essa crítica feita na França onde os
descendentes de imigrantes árabes são uma minoria oprimida, alvo do ódio da
Frente Nacional, reforça esse fascismo.
Os cartunistas deviam saber que a sua
sátira levava água ao moinho da direita anti-imigrante. Não por acaso, toda a
burguesia imperialista uniu-se sob o lema: nós somos Charlie, e pela liberdade
ilimitada de crítica. A mesma liberdade que negam à crítica ao sionismo. É uma
ironia cruel ver abraçados os maiores verdugos da liberdade em nome da defesa
dessa mesma liberdade, que é negada aos imigrantes árabes na França com a
proibição do uso do véu para as mulheres (proibir o véu é tão autoritário como
obrigar o seu uso), proibição da reza em público dos muçulmanos (ninguém
proibiu as procissões católicas) e dos atos em defesa dos palestinos,
massacrados pelo assassino Netanyahu. Os milhões de franceses que se
manifestaram em nome do “somos todos Charlie”, não se lembraram dos povos
árabes e africanos, invadidos pela França (Líbia, Mali, Iraque, República
Centro Africana) e não derramaram uma lágrima pelos milhares de muçulmanos
mortos pelas valentes armas francesas.
O
marxismo entende que o inimigo principal está em casa. Para os trabalhadores e
a verdadeira esquerda francesa, o inimigo principal é o colonialismo francês, e
não os imigrantes muçulmanos e muito menos a religião islâmica. Argumenta-se
que seria um direito democrático a sátira às religiões em geral e ao islamismo
em particular. Charlie Hebdo não critica
o terrorismo travestido de islâmico, mas a religião islâmica e o profeta Maomé.
Vincula subliminarmente o islamismo ao terrorismo. Não é uma crítica séria à
religião, mas uma posição política conveniente à xenofobia antimuçulmana.
Esculachar Maomé em nada questiona os defeitos do islamismo, é apenas uma
provocação ao povo muçulmano.
A crença no sobrenatural é inerente ao
homem primitivo, o reflexo do seu desamparo diante das forças da natureza,
segundo Freud. As religiões interpretam cada qual a seu modo, a suposta vontade
divina. São uma espécie de procuradores de Deus na terra. Cada religião
institui os seus dogmas e códigos morais, que geralmente se adaptam à cultura
de cada época. O fundamentalismo consiste na tentativa de regredir a roda da
história aos dogmas originais. As religiões substituem a luta pela justiça
terrena pela promessa do paraíso no céu. Nesse sentido, são o ópio do povo.
Criticamos as religiões respeitando os
sentimentos religiosos do povo. Declaramos inaceitáveis as práticas religiosas
que contrariem os princípios básicos da civilização, já consagrados. Por
exemplo: o sacrifício de crianças, a mutilação sexual das mulheres, o racismo,
o machismo, a vinculação da igreja ao Estado, etc. O fundamentalismo islâmico
tenta reintroduzir o islamismo como religião do Estado e a sharia como norma. O
sionismo judeu considera os judeus o “povo eleito”, os demais seriam cidadãos
de segunda classe. Recentemente, Israel foi declarado Estado judaico, excluindo
da cidadania plena os cidadãos árabes de Israel. Combatemos, particularmente, o
papel político das igrejas, que em geral atuam como partido político da burguesia.
A propaganda é um método secundário na
crítica às religiões. Apenas a luta de classes pode emancipar o proletariado
das suas misérias terrenas, criando as condições para que dispensem a bengala
religiosa. Essa luta requer a unidade de todo o proletariado, crentes e ateus.
Não por acaso, a burguesia tenta dividi-los instigando o ódio religioso. Todo
aquele que coloca querelas religiosas bizantinas acima da luta de classes
presta um serviço à burguesia.
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