Os Estados Unidos entraram em decadência, embora ainda seja o
principal ator da geopolítica internacional. A sua economia decresce
relativamente, o seu papel na produção diminui e está afogado em dívidas.
Mantém ainda uma preponderância parasitária no mercado financeiro, alicerçado
no monopólio do dólar como moeda mundial, e uma grande superioridade militar. Será
um processo longo e traumático. Surgem novos postulantes à hegemonia mundial: a
China, coadjuvada pela Rússia e, em menor medida, pelos BRICs, pela Organização
de Cooperação de Xangai e pela Aliança Euro Asiática. O PIB da China acaba de
superar o dos EUA, embora ainda não lhe equivalha em tecnologia, produtividade
do trabalho e muito menos no terreno militar. Especula-se sobre a criação de
novas moedas em substituição ao dólar.
Com
base na sua superioridade militar, os EUA tenta abortar na casca o surgimento
de novos concorrentes. Em geral, os conflitos atuais têm esse pano de fundo (Afeganistão,
Geórgia, Venezuela, Iraque, Irã, Líbia, Síria e Ucrânia), ou seja, são uma
tentativa de cerco militar e econômico a esses países, principalmente,
estrangulando o fornecimento de matérias primas, sabotando os gasodutos e
oleodutos dos concorrentes. Por exemplo, o Estado Islâmico serve a muitos
objetivos: à deposição de Al Saad, à divisão do Iraque entre sunitas, xiitas e
curdos, impedindo a passagem do gasoduto Irã, Iraque e Síria.
O enfraquecimento
imperialista tem provocado um limitado movimento centrífugo de algumas das suas
semi-colônias, que oscilam entre um e outro desses dois pólos (Venezuela, Bolívia,
Equador, Brasil, Argentina, Irã). Os Estados Unidos expandem a OTAN para os países
da antiga URSS, cercando a Rússia. O último lance foi o golpe de Estado
patrocinado pela Cia na Ucrânia, provocando a Rússia, ao posicionar os seus mísseis
às portas de Moscou, e afastando dela a Europa, que é o seu maior parceiro
comercial. Alguns analistas caracterizam esses conflitos como o começo de uma
nova guerra fria. Esse cerco à Rússia e à China tem provocado também um efeito
inverso, acelerando e aprofundando o bloco comercial e político entre os dois.
Rússia e China acabam de firmar um vultoso acordo comercial e planejam
construir novas “rotas da seda”, por terra e por mar, ligando a China, Índia,
Ásia central, Rússia e Europa.
O Brasil na nova guerra
fria
O bloco dirigido pelo PT já não se
alinha de forma tão automática aos Estados Unidos e passa a fazer parte dos
BRICs. Essa política desagrada ao imperialismo dominante e parte da burguesia
mais alinhada ao mesmo. Outra parte da grande burguesia mantém o apoio à Dilma.
A candidatura de Aécio Neves representa a subserviência total aos Estados
Unidos, contra a aproximação ao bloco China/Rússia. Essas diferenças não são
qualitativas e não justifica o apoio a Dilma. Os EUA tentam enquadrar as
“ovelhas rebeldes”. Em alguns casos, procuram abertamente desestabilizar os
seus governos, como na Venezuela.
A aproximação do PT e aliados aos BRICs,
não significa rompimento com o imperialismo, embora seja para este inaceitável,
e não representa uma política externa mais progressista, como supõe parte da
esquerda, que caracteriza o governo erroneamente como de centro esquerda. O
governo Dilma difere de governos tipo o do Peru e Colômbia, e um possível
governo Aécio, por um maior populismo e um tímido distanciamento dos EUA, mas
também é pró-imperialista e praticante do liberalismo econômico. A aproximação
ao bloco Rússia/China não significa anti-imperialismo porque não representa
rompimento com os EUA/Europa e esses países também são candidatos à condição de
imperialistas, e em alguns casos já agem como tais (Ucrânia, por exemplo).
A esquerda e a nova guerra
fria
O
conflito entre Rússia e Estados Unidos em torno da Ucrânia é um conflito
inter-imperialista. Coloca-se na Ucrânia a luta dos trabalhadores pela
independência de classe, contra o conjunto do capital internacional e seus
agentes americanos ou russos. Isso não significa ignorar a realidade e as
contradições inter-imperialistas. Na prática, o proletariado deve enfrentar o
inimigo mais perigoso de cada vez. O inimigo mais agressivo são os EUA, que
patrocina as bandas fascistas de Kiev. Essa política prática, que admite
acordos pontuais, não justifica o apoio à Rússia, como o mal menor. A proposta
de frente única permanente com a Rússia é uma capitulação. O proletariado da
Criméia, Donetsk e Lugansk deve manter total independência da Rússia. A esquerda capitula a um ou outro imperialismo.
Uma parte coloca-se à reboque do imperialismo hegemônico EUA/Europa
(morenistas) e outra parte (estalinistas e “trotskistas” afins ao estalinismo)
à reboque dos pretendentes China/Rússia, tomando a sua oposição aos EUA como
progressista.
Essa capitulação no plano externo se
transfere para o plano interno. Parte da esquerda declara o voto nulo (PSTU) e
outra parte o voto em Dilma (PSOL e grupos menores). O PSTU, que costumava
alinhar-se à Frente Popular, agora chama o voto nulo. Isso é coerente com a sua
capitulação ao imperialismo EUA/Europa (Líbia, Síria, Ucrânia), onde deu apoio
a agressão imperialista a esses regimes. Pelo mesmo motivo, não cairia bem
votar em Dilma. Em sentido inverso,
parte da esquerda que costumava propor o voto nulo, agora vai de Dilma. Isso
está de acordo com o seu apoio à Rússia na Ucrânia, por exemplo. A tomam como
progressista pelo seu alinhamento aos BRICs. Alegam que não estão optando pelo
mal menor, mas combatendo na prática o inimigo mais perigoso. Mas as eleições
não são uma questão prática, mas uma luta de programas. Portanto, o voto em
Dilma é sim um voto num suposto mal menor, que não existe. Genericamente, Aécio
não é o inimigo principal. Programaticamente, ambos se equivalem. As diferenças
entre eles se verão ou não na prática, o que não justifica o voto em
Dilma. A política da esquerda reflete
essa nova guerra fria, onde ninguém preserva a independência de classe. Apenas
o voto nulo corresponde aos interesses do proletariado, de aposta na sua
organização e luta pelo socialismo.
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